sábado, 25 de maio de 2013

MEMORANDO



Então me concentrei dizendo:
Guarda-a na memória esta paisagem
que não se repetirá na face da terra
com as mesmas indefinidas cores.
E esse vulto que teus olhos não verão de novo
passar com idênticos movimentos rítmicos.
E essa voz que te saudou do outro lado do oceano
assim como um fugidio marulho de ondas.
A paisagem desapareceu entre as cinzas do informe.
O vulto não regressou em sucedimento a si próprio.
A voz perdeu o timbre no exaurir da mensagem.
Mas por milagre se conservam tangíveis
dentro de um vago mundo sem dimensões
a paisagem o vulto a voz
que de longe em longe reencontro.
Aquela paisagem ninguém a viu como eu.
Aquele vulto não foi captado senão por mim.
Aquela voz me tocou e não a outrem.
Frágil tesouro da memória
– antes que a noite me desarme –
por algum tempo ainda resguardado

- Henriqueta Lisboa,
 in "Pousada do Ser"

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