quarta-feira, 23 de abril de 2014

VIAJAR É MAIS QUE PRECISO*



 Preparou-se para aquela
 que não sabia ser sua pequena,
 grande ou maior viagem.
 
 Preparou-se para aquela
 que não sabia ser sua amena,
 áspera ou derradeira viagem.
 
 Preparou-se para aquela
 que não sabia ser penúltima,
 ou mais uma daquelas passagens.
 
 E o fez com o mais cuidadoso
 e lúcido, ácido e ávido pensar.
 
 Sabia que devia; que havia 
 de assim melhor ser: para ele
 um singular e sobreviver:
 
 Fosse na Luz aguda e infinita
 Ou na Treva arguta e maldita.
 
 Mas, sem rancor ou medo,
 ímpar Fé ou maior descrer,
 sabia que já estava pronto.
 
 Mãos e olhos fixos; o corpo
 disposto, as mãos desatadas:
 nos lábios as últimas palavras.
 
 Por entre os dedos, o Tempo,
 em horizonte perto ou distante,
 não mais lhe ditava as regras!
 
 Ele, nem vítima, herói ou rei, 
 não mais construía verdes pontes. 
 Agora, só admirava o abismo.
 
 Assim, ciente de que o coração;
 da sua, nem árdua, original, difícil 
 e inversa decisão, sem medos 
 ou oração, já não vinha tão cedo. 

 
 *Jairo De Britto,
 em "Dunas de Marfim"
 

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