Em solidão amadurece
a fruta arrebatada ao galho
antes que o sol amanhecesse.
Antes que os ventos a embalassem
ao murmurinho do arvoredo.
Antes que a lua a visitasse
de seus mundos altos e quedos.
Antes que as chuvas lhe tocassem
a tênue cútis a desejo.
Antes que o pássaro libasse
do palpitar de sua seiva
o sumo, no primeiro enlace.
Na solidão se experimenta
a fruta de ácido premida.
Mas ao longo de sua essência
já sem raiz e cerne e caule
perdura, por milagre, a senha.
Então na sombra ela adivinha
o sol que a transfigura em sol
a suaves pinceladas lentas.
E ouve o segredo desses bosques
em que se calaram os ventos.
E sonha invisíveis orvalhos
junto à epiderme calcinada.
E concebe a imagem da lua
dentro de sua própria alvura.
E aceita o pássaro sem pouso
que a ensina, doce, a ser mais doce.
Henriqueta Lisboa
in Além da Imagem
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